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Professor, Advogado, Especialista em Direito Constitucional pela Escola Paulista de Direito, Pós Graduado em Direito Constitucional e Administrativo, sócio fundador da Peres e Almeida Advogados Associados, sócio fundador da Bait Iehuda Condomínios, Membro do GEA - Grupo de Estudos Avançados do Complexo Jurídico Damásio de Jesus, fundador e Conselheiro Vitalício do IPAM - Instituto Paulista dos Advogados Maçons

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Edipo Rei - 3a. Parte

Continuação do dia 20/12/2010


No trecho de hoje, Édipo começa a desconfiar que matou seu pai e casou-se com sua mãe. Jocasta revela a Édipo que Laio consultara o oráculo recebendo deste a visão de seu trágico fim.


Entra CREONTE, possuído de forte irritação

CREONTE: Cidadãos! Acabo de saber que Édipo formulou contra mim gravíssimas acusações, que eu não posso admitir! Aqui estou para me defender! Se, no meio da desgraça que nos aflige, ele supõe que eu o tenha atacado, por palavras ou atos, não quero permanecer sob o vexame de semelhante suspeita, pois para mim isso não seria ofensa de somenos valor, mas sim uma profunda injúria, qual a de ser por vós, e por meus amigos, considerado um traidor!

CORIFEU: Talvez essa acusação injuriosa lhe tenha sido ditada pela cólera momentânea, e não pela reflexão.

CREONTE: Quem teria insinuado a Lúdipo que por meu conselho o adivinho proferiu aquelas mentiras?

CORIFEU: Realmente, ele assim declarou, mas não sei com que fundamento. `

CREONTE: E foi com olhar sereno e raciocínio seguro que ele ergueu tal denúncia?

CORIFEU: Não sei dizer... Não posso penetrar no íntimo dos poderosos; mas... ei-lo que sai do palácio.

Entra ÉDIPO, bruscamente

ÉDIPO: Que vieste fazer aqui? Tens coragem de vir a minha casa, tu, que conspiras contra minha vida, e pretendes arrancar-me o poder? Vamos! Dize-me, pelos deuses! pensas tu, por acaso, que eu seja um covarde, ou um demente, para conceberes tais projetos? Supunhas que eu nunca viesse a saber de tuas ações secretas, e que não as punisse logo que fossem descobertas? Não será intento de um louco pretender, sem riqueza e sem prosélitos, uma autoridade que somente nos podem dar o povo e a fortuna?

CREONTE: Sabes o que importa fazer? Deixa-me responder a tuas palavras de igual para igual, e só me julgues depois de me teres ouvido!

ÉDIPO: Tu és hábil em manobrar a palavra; mas eu não me sinto disposto a ouvir-te, sabendo que tenho em ti um inimigo perigoso.

CREONTE: A tal respeito, ouve o que te quero dizer.
ÉDIPO: Sim; ouvirei; mas não insistas em afirmar que não és culpado.

CREONTE: Tu te enganas, se crés que a teimosia seja uma virtude.

ÉDIPO: E tu não te iludas pensando que ofenderás a um parente, sem que recebas o devido castigo.

CREONTE: De acordo; tens razão nesse ponto; mas dize-me qual foi a ofensa que te fiz!

ÉDIPO: Foste tu, ou não, quem me aconselhou a mandar vir esse famoso profeta?

CREONTE: Sim; e mantenho minha opinião acerca dele.

ÉDIPO: Há quanto tempo Laio...

CREONTE: Mas que fez ele? Não compreendo!...

ÉDIPO: ...Desapareceu, vítima de um assassino?

CREONTE: Já lá se vão muitos anos!

ÉDIPO: E já nesse tempo Tirésias exercitava sua ciência?

CREONTE: Sim; ele já era, então, sábio e respeitado.

ÉDIPO: E, nessa época, disse ele alguma coisa a meu respeito?

CREONTE: Nunca! pelo menos em minha presença.

ÉDIPO: E vós não fizestes pesquisas a fim de apurar o crime?

CREONTE: Fizemos, certamente, mas nada se descobriu.

ÉDIPO: Como se explica, pois, que esse homem tão hábil, não tivesse dito então o que diz hoje?

CREONTE: Não sei; e, quando desconheço uma coisa, prefiro calar-me!

ÉDIPO: Tu não ignoras, no entanto, e deves em plena consciência confessar...

CREONTE: Que devo eu confessar? Tudo o que souber, direi!

ÉDIPO: ...Que, se ele não estivesse de conluio contigo, nunca viria dizer que a morte de Laio foi crime por mim cometido.

CREONTE: Que ele disse, tu bem sabes. Mas também eu tenho o direito de te dirigir algumas perguntas.

ÉDIPO: Pois interroga-me! Tu não me convencerás de que haja sido eu o assassino.

CREONTE: Ora vejamos: tu desposaste minha irmã?

ÉDIPO: É impossível responder negativamente a tal pergunta.

CREONTE: E reinas tu neste país com ela, que partilha de teu poder supremo?

ÉDIPO: Sim; e tudo o que ela deseja, eu imediatamente executo.

CREONTE: E não serei eu igualmente poderoso, quase tanto como vós?

ÉDIPO: Sim; e por isso mesmo é que pareces ser um pérfido amigo.


CREONTE: Não, se raciocinares como eu. Examina este primeiro ponto: acreditas que alguém prefira o trono, com seus encargos e perigos, a uma vida tranqüila, se também desfruta poder idêntico? Por minha parte, ambiciono menos o título de rei, do que o prestígio real; e como eu pensam todos quantos saibam limitar suas ambições. Hoje alcanço de ti tudo quanto desejo: e nada tenho a temer... Se fosse eu o rei, muita coisa, certamente, faria contra aminha vontade... Como, pois, iria eu pretender a realeza, em troca de um valimento que não me causa a menor preocupação? Não me julgo tão insensato que venha a cobiçar o que não seja para mim, ao mesmo tempo honroso e proveitoso. Atualmente, todos me saúdam, todos me acolhem com simpatia; os que algo pretendem de ti, procuram conseguir minha intercessão; para muitos é graças a meu patrocínio que tudo se resolve. Como, pois, deixar o que tenho, para pleitear o que dizes? Tamanha perfídia seria também uma verdadeira tolice! Não me seduz esse projeto; e, se alguém se propusesse a tentá-lo, eu me oporia à cuja realização. Eis a prova do que afirmo: vai tu mesmo a Delfos e procura saber se eu não transmiti fielmente a resposta do oráculo. Eis outra indicação: se tu provares que eu estou de concerto com o  adivinho, condenar-me-ás à morte não por um só voto, mas por dois: o teu e o meu. Não me acuses baseado em vagas suspeitas, sem me ouvir primeiro. Não é lícito julgar levianamente como perversos, os homens íntegros, assim como não é justo considerar íntegros os homens desonestos. Rejeitar um amigo fiel, penso eu, equivale a desprezar a própria vida, esse bem tão precioso! O tempo fará com que reconheças tudo isso com segurança, pois só ele nos pode revelar quando os homens são bons, ao passo que um só dia basta para evidenciar a maldade dos maus.

CORIFEU: Para quem, sinceramente, quer evitar a injustiça, ele muito bem te falou, ó rei. É sempre falível o julgamento de quem decide sem ponderação!

ÉDIPO: A fim de revidar um ataque às ocultas urdido contra mim, devo estar pronto, sempre, para a defesa. Se eu esperar tranqüilamente, os planos deste homem serão realizados, e os meus fracassarão.

CREONTE: Que pretendes tu, nesse caso? Exilar-me do país?

ÉDIPO: Não!; tua morte, e não apenas o desterro o que eu quero.

CREONTE: Mas... quando puderes comprovar que eu conspiro contra ti!

ÉDIPO: Falas como quem se dispõe a não obedecer?

CREONTE: Sim, porque vejo que não estás deliberando com discernimento.

ÉDIPO: Só eu sei o que me convém fazer, no meu interesse.

CREONTE: Mas, nesse caso, também o meu interesse deve ser atendido!

ÉDIPO: Mas tu és um traidor!

CREONTE: E se o que afirmas não for verdade?

ÉDIPO: Seja como for, eu devo ser obedecido!

CREONTE: Não, se ordenares o que não for justo!

ÉDIPO: Ó cidade de Tebas!

CREONTE: Também eu posso convocar a cidade; ela não é tua, exclusivamente!

O CORO: Acalmai-vos, ó Príncipes! Muito a propósito vem ter convosco a rainha Jocasta; vejo-a neste momento sair do palácio: Ela dará, certamente, a vosso dissídio, feliz solução.

Entra JOCASTA

JOCASTA: Por que provocastes, infelizes, esse imprudente debate? Não vos envergonhais em discutir questões íntimas, no momento em que atroz calamidade cai sobre o país? Volta a teu palácio, Édipo; e tu, Creonte, a teus aposentos. Não exciteis, com palavras vãs, uma discórdia funesta.

CREONTE: Édipo, teu marido, ó minha irmã, julga acertado tratar-me cruelmente, impondo-me ou o desterro para longe da pátria, ou a morte.
ÉDIPO: É verdade, minha esposa. Acusei-o de conspirar contra a minha pessoa.

CREONTE: Que seja eu desgraçado! Que morra maldito se cometi a perfídia de que me acusas!

JOCASTA: Pelos deuses, Édipo, - crê no que ele te diz! E crê, não só pelo juramento que proferiu, mas também em atenção a mim e a todos quantos estão presentes!

O CORO: Deixa-te persuadir, rei Édipo! Nós te pedimos!

ÉDIPO: Como, e em quê, desejais que eu ceda?

O CORO: Este homem não é criança, Édipo! Se prestou tão solene juramento, respeita-o!

ÉDIPO: Sabeis, acaso, o que ele pretende?

CORIFEU: Eu sei!

ÉDIPO: Explica-te, pois!

CORIFEU: Não acuses por uma vaga suspeita, e não lances à desonra um amigo que se votou, ele próprio, à eterna maldição!

ÉDIPO: Sabes que tal pedido equivale a querer minha morte, ou meu exílio para país distante?

CORIFEU: Não! Pelo Deus supremo! Por Hélios! Que eu morra, detestado pelos deuses e pelos homens se tiver semelhante pensamento! Mas a desgraça que me aflige, e a todo o povo de Tebas, já é bastante; não queiramos acrescentar-lhe novos motivos de desgosto!

ÉDIPO: Que ele se retire, pois, ainda que disso resulte minha morte, ou meu desterro! Cedo a vosso pedido, ó tebanos! - e não ao dele; só  vosso me comoveu! Creonte, esteja onde estiver, ser-me-á sempre odioso!

CREONTE: Cedeste contra a vontade, vê-se bem; mas sentirás remorsos, quando tua cólera se extinguir. Um caráter como o teu é uma fonte de dissabores.

ÉDIPO: Não me deixarás, finalmente, em paz? Queres, ou não, sair de Tebas?

CREONTE: Sim! Eu partirei! Doravante não me verás, nunca mais! Para os tebanos, porém, serei sempre o mesmo!

(Sai CREONTE)

CORIFEU:  Ó rainha, por que não conduzes teu marido para o palácio?

JOCASTA: Farei o que pedes, quando souber o que se passou.

CORIFEU: Fúteis palavras provocaram vagas suspeitas; ora, mesmo o que carece de fundamento muita vez nos corrói o coração.

JOCASTA: E as ofensas foram recíprocas?

CORIFEU: Oh! Certamente que sim.

JOCASTA: E que diziam eles?

CORIFEU: Melhor fora, ó rainha, encerrar este conflito no ponto em que ficou, pois já nos amargura demais o infortúnio de nosso país.

ÉDIPO: Vês tu a que situação chegamos, apesar de tuas boas intenções? E tudo porque descuraste de meus interesses, e deixaste diminuir a afeição que tinhas por mim.

O CORO: Já muitas vezes te dissemos, ó príncipe, que nós seríamos em nossa própria opinião, loucos e imprudentes se te abandonássemos agora, a ti, que nos puseste no bom caminho quando a pátria sucumbia! Sê, pois, hoje como outrora, o nosso guia!

Mornento de silêncio

JOCASTA: Mas, pelos deuses, Édipo, diz-me: por que razão te levaste a tão forte cólera?

ÉDIPO: Vou dizer-te, minha mulher, porque te venero mais do que a todos os tebanos! Foi por causa de Creonte, e da trama que urdiu contra mim.

JOCASTA: Explica-me bem o que houve, para que eu veja se tuas palavras me convencem.

ÉDIPO: Ele presume que tenha sido eu o matador de Laio!

JOCASTA: Mas... descobriu ele isso, ou ouviu de alguém?

ÉDIPO: Ele insinuou isso a um adivinho, um simples impostor, porquanto ele próprio nada se atreve a afirmar.

JOCASTA: Ora, não te preocupes com o que dizes; ouve-me, e fica sabendo que nenhum mortal pode devassar o futuro. Vou dar-te já a prova do que afirmo. Um oráculo outrora foi enviado a Laio, não posso dizer se por Apoio em pessoa, mas por seus sacerdotes, talvez... O destino do rei seria o de morrer vítima do filho que nascesse de nosso casamento. No entanto, - todo o mundo sabe e garante, - Laio pereceu assassinado por salteadores estrangeiros, numa encruzilhada de três caminhos. Quanto ao filho que tivemos, muitos anos antes, Laio amarrou-lhe as articulações dos pés, e ordenou que mãos estranhas o precipitassem numa montanha inacessível. Nessa ocasião, Apoio deixou de realizar o que predisse!... Nem o filho de Laio matou o pai, nem Laio veio a morrer vítima de um filho, morte horrenda, cuja perspectiva tanto apavorava! Eis aí como as coisas se passam, conforme as profecias oraculares! Não te aflijas, pois; o que o deus julga que deve anunciar, ele revela pessoalmente!

Momento de silêncio

ÉDIPO: Como esta narrativa me traz a dúvida ao espírito, mulher! Como me conturba a alma!...

JOCASTA: Que inquietação te pode causar esta lembrança do nosso passado?

ÉDIPO: Suponho que disseste ter sido Laio assassinado numa tríplice encruzilhada?

JOCASTA: Sim; disseram então, e ainda agora o afirmam.

ÉDIPO: E onde se deu tamanha desgraça?

JOCASTA: Na Fócida, no lugar exato em que a estrada se biparte nos caminhos que vão para Delfos e para Dáulis.

ÉDIPO: E há quanto tempo aconteceu isso?

JOCASTA: A notícia aqui chegou pouco antes do dia em que foste aclamado rei deste país.

ÉDIPO: Ó Júpiter! Que quiseste fazer de mim?

JOCASTA: Dize-me, Édipo, que é que tanto te impressiona assim?

ÉDIPO: Não me perguntes nada, ainda. Como era então Laio? Que idade teria?

JOCASTA: Era alto e corpulento; sua cabeça começava a branquear. Parecia-se um pouco contigo.

ÉDIPO: Ai de mim! Receio que tenha proferido uma tremenda maldição contra mim mesmo, sem o saber!

JOCASTA: Que dizes tu? Teu semblante causa-me pavor, ó príncipe!

ÉDIPO: Estou aterrado pela suposição de que o adivinho tenha acertado... Mas tu me elucidarás melhor, se acrescentares algumas informações.
JOCASTA: Também eu me sinto inquieta... mas responderei imediatamente a tuas perguntas.

ÉDIPO: Viajava o rei Laio com reduzida escolta, ou com um grande número de guardas, como um poderoso soberano que era?

JOCASTA: Ao todo eram cinco os viajantes, entre os quais um arauto. Um só carro conduzia Laio.

ÉDIPO: Ah! Agora já se vai esclarecendo tudo... Mas quem te forneceu estas minúcias, senhora?

JOCASTA: Um servo que voltou, o único que conseguiu salvar-se.

ÉDIPO: E vive ainda no palácio, esse homem?

JOCASTA: Não. Quando voltou a Tebas, e viu que tu exercias o poder real, em substituição ao falecido rei Laio, ele me pediu, encarecidamente, que o mandasse para o campo, a pastorear os rebanhos, para que se visse o mais possível longe da cidade. E eu atendi a esse pedido, pois na verdade, mesmo sendo ele um escravo, merecia ainda maior recompensa.

ÉDIPO: Seria possível trazê-lo imediatamente ao palácio?

JOCASTA: Certamente. Mas... para que chamá-lo?

ÉDIPO: É que eu receio, senhora, já ter descoberto muita coisa do que ele me vai dizer.

JOCASTA: Pois ele virá. Mas também eu tenho o direito de saber, creio eu, o que tanto te inquieta.

ÉDIPO: Não te recusarei essa revelação, visto que estou reduzido a uma última esperança. A quem poderia eu, com mais confiança, fazer uma confidência de tal natureza, na situação em que me encontro?

Momento de silêncio


Continua no dia 03/01/2011

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